Artigo escrito pelo Prof. Me. Cristiano Dionísio
A crise que muitos apontam em relação ao processo educacional no Brasil, em especial em face do ensino superior, tem uma inequívoca dimensão ética. E sobre isto, acredito, não há mais tempo para desconsiderar a importância de tal tema.
A ética é um tema rico e que permite ser abordado por diversas perspectivas. Desde Aristóteles aos tempos atuais, muitos pensadores procuram defini-la e, com isso, tê-la como guia de suas ações cotidianas. Nesta linha, ainda que de forma simplificada, pode-se dizer que a ética é uma forma de conduta pautada por virtudes. O importante, assim, é entender que a ética se revela na conduta, ou seja, no comportamento da pessoa no caso em concreto.
Conduta esta que precisa estar orientada pelas virtudes socialmente aceitas ou desejadas naquele contexto. Não por acaso, portanto, muitas carreiras normatizadas (reguladas por lei) possuem código de éticas próprios.
É nesta moldura que se pode pensar, entendo, a perspectiva da ética acadêmica, ou seja, qual tipo de comportamento virtuoso pode-se esperar de um estudante nos tempos atuais, no contexto socioeconômico no qual estamos inseridos? Farei esta reflexão diante do campo que mais me é próximo, qual seja, o dos Cursos da Escola de Direito UniDomBosco (Direito, Investigação Forense e Perícia Criminal, Serviços Jurídicos e Notariais e Gestão de Segurança Privada).
AUTORRESPONSABILIDADE
Cabe ao estudante estudar e, por meio do estudo, realizar o seu processo de aprendizagem. Esta afirmação, tão evidente quanto antiga, pode causar estranheza em alguns.
De uma perspectiva ética é preciso que o estudante reconheça a si mesmo como o protagonista do processo acadêmico. A aprendizagem, sob certa perspectiva, talvez seja o mais solitário dos processos. Ninguém, jamais, em tempo algum, poderá aprender no lugar de uma terceira pessoa.
Jamais houve tantos recursos educacionais quanto hoje. Vive-se, literalmente, uma economia cada vez mais informacional e o acesso ao conteúdo de diversos campos do saber pode se dar por múltiplas plataformas e ferramentas, inclusive gratuitas. Em nível de
Graduação não há mais obras inacessíveis. Ainda assim, contudo, paradoxalmente, vê-se que muitos alunos pensam somente na avaliação, e não no processo de aprendizado e, com isso, inverte-se o que seria a lógica do processo.
O estudante que se preocupa somente com o processo de avaliação está, ainda que de forma involuntária, renunciando ao seu protagonismo acadêmico e, com isso, deixando de ser sujeito para abraçar a condição de objeto. O correto, entendo, seria preocupar-se com a sua própria aprendizagem para fazer da avaliação uma consequência natural deste processo.
A autorresponsabilidade, portanto, é um valor que deve se manifestar no processo de aprendizagem do estudante e, sempre que aquele exerce sua função de acordo com tal valor, exercerá uma conduta acadêmica ética. É manifestação da autorresponsabilidade não deixar conteúdos serem acumulados. É manifestação de autorresponsabilidade organizar suas anotações e resumos. É manifestação de autorresponsabilidade cumprir com os horários das atividades acadêmicas, sejam elas presenciais ou síncronas (para os cursos e disciplinas em EaD). É manifestação de autorresponsabilidade fazer as leituras indicadas. É manifestação de autorresponsabilidade conhecer o calendário acadêmico e os processos institucionais.
É, em síntese, manifestação de autorresponsabilidade os comportamentos dos estudantes que confirmam o seu protagonismo enquanto sujeito da sua própria aprendizagem.
Infelizmente, contudo, isso nem sempre se verifica. Constato, por vezes, alunos que estão mais preocupados com quantas faltas podem ter em uma disciplina presencial, do que com o conteúdo que está sendo desenvolvido. Nos cursos ofertados na modalidade em EAD há, infelizmente, acadêmicos que não procuram esclarecer suas dúvidas com os tutores das suas disciplinas no momento apropriado, procurando fazê-lo somente durante a semana de avaliação, por exemplo.
Se todos desejam uma melhor qualidade de ensino, é preciso ter em mente que ela só se dará por meio de uma melhor aprendizagem e, é preciso reconhecer, que não há aprendizagem possível sem que cada estudante tenha consigo mesmo o compromisso de realizar-se por meio da sua própria educação. A autorresponsabilidade é, assim, um valor a ser considerado como guia para condutas eticamente válidas sob a perspectiva acadêmica.
HONESTIDADE
Outro aspecto sobre o qual pode-se refletir com profundidade é a perspectiva da honestidade nos processos acadêmicos, em especial nos processos avaliativos. Em tempo de tantas formas de comunicação, bots e plataformas de inteligência artificial é preciso ter atenção quanto à honestidade como um valor próprio da ética acadêmica.
A honestidade é imprescindível no processo de aprendizagem. O estudante, como defendido acima, precisa assumir o seu protagonismo acadêmico no referido processo, somente pode fazê-lo de forma integra por meio daquele valor.
Qualquer tentativa que se tenha de burlar o processo acadêmico, seja ou não nos momentos de avaliação, é contrário à verdade com que se busca a realização acadêmica.
Plágios e “colas”, portanto, são manifestações da mentira enquanto vício, e não da verdade enquanto virtude. Se a conduta ética é guiada por virtudes, e não por vícios, fica claro que no âmbito acadêmico todas as mentiras projetam-se na dimensão do antiético.
Alunos que tentam trocar mensagens entre si durante as avaliações, ou que procuram descobrir “se a prova da manhã e da noite” serão iguais, infelizmente, como dito acima, subverteram a lógica acadêmica e estão considerando a avaliação mais importante que o aprendizado em si.
Nos cursos que integram a Escola de Direito UniDomBosco entende-se que os valores
da justiça, honestidade, lealdade, boa-fé, bem comum e igualdade, dentre outros, devem ser os elementos norteadores das condutas dos profissionais que aqui se formam. Nenhum deles pode ser alcançado por meio de práticas que, já durante a graduação, reflitam a mentira e a desonestidade.
Sob este aspecto é digno de mérito aquele que erra de forma honesta e, com isso, possui fundamento para corrigir seu erro e prosseguir com mais força e vigor, do que aquele que anabolizando seu ego, mente e age de forma desonesta em suas avaliações, tentando enganar sua Instituição e a sociedade (quando na verdade engana-se a si mesmo).
Acredita-se, portanto, que a autorresponsabilidade e a honestidade são colunas do agir ético no âmbito acadêmico, sem as quais a própria compreensão do que significa ser estudante perde-se do sujeito que exerce a função. Um estudante não ético é um simulacro triste de tudo aquilo que ele poderia vir a ser e, neste sentido, todos perdemos.